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quarta-feira, 20 de janeiro de 2016

Excerto de " Os Famintos "




Mariano Donato estava cansado, segurou carinhosamente os braços de Lucília, e mergulhando naqueles grandes olhos amendoados, castanhos, cor de avelã, disse-lhe;

- O mundo está cada vez mais líquido e efémero, e este não é o meu mundo.
Eu quero outras coisas, quero deixar-me ficar com esta chuva sem tréguas e este remoinho de vento que nos faz mais vivos, quero guardar para sempre a infinita maciez da tua pele, reencontrar-me na profundidade e no cheiro do teu corpo, sentir o êxtase de todos os teus prazeres, guardar-te nos meus contrastes, nos pigmentos que emolduram o teto côncavo da minha vida, e onde eu estiver, num lugar qualquer, serás sempre o meu gesto, a razão da minha sobrevivência, e a miragem indescritível, que os meus olhos inventam.

Lucília escutou, sorriu, e chorou.

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Luis de Sousa - excerto de “ Os Famintos “